cura
disponho as palavras de modo diferente e reinvento a minha já inerte maneira de escrever. vejo-me de fora sem a dependência do meu corpo às minhas doenças: como se não me fosse; sem as feridas em grito. critico-me sem mágoa. escrevo com a caneta sem a minha tinta em constante indecisão.
nesta visão de fora que me constrói, crio finalmente uma ideia real do que transpareço. mas (re)reflectir-me na retina recria também uma nova alteração no que pareço. o processo é anulado, falha-se a tentativa de ter uma visão fugaz e isenta deste eu que ando a tentar descobrir (e talvez gostar): o meu corpo insiste em ser-me, em aperceber-se de que eu o observo. e aí, baixo a cabeça e abstraio-me, até voltar a reconhecer a minha voz.
maharet