um primeiro adeus

a brisa matinal que por nós passa convida-nos a ir com ela. o traço com que vais preenchendo o guardanapo de papel é conduzido pela perfeição. desfoco o olhar no gancho que te prende o cabelo. tudo o resto se condensa num sussurro.

deixemos então que o silêncio paute a nossa mútua presença.
 
 
 
 
 
é assim que mais se diz.

ficar

se eu pudesse não partir
eu ficava aqui contigo

se eu pudesse não querer
…descobrir

se eu pudesse não escolher
eu juro, era este o meu abrigo

se eu pudesse não saber
…que há mais

ficar

ficar

mas como pode a lua não querer o céu
como pode o mar não querer o chão
como pode a vontade acalmar o desejo
como posso eu ficar?
 
 
margarida pinto

por mim

o mundo lá fora bem podia acabar. ou com menor dispêndio de energia acabar só o meu.

só. percorrendo as ruas.

só percorrendo as ruas da cidade ela me pode ser íntima. à chuva. de madrugada. até ser a cidade a chorar por mim.

b.d.m.

o ódio em mim é branco
de tão negro

deixa-me sonhar os sonhos
mais doces são aqueles
em que te apunhalo
como risco esta página
 
 
(2001)

gumes de frio trespassam o corpo.

a noite é mais noite no meio da auto-estrada. estilhaços rentes à linha do horizonte; sangue no alcatrão.

quarenta e dois

para a carla
 
 
às vezes deitava-me no chão.
ficava quieto
a observar as nuvens no céu.

e as esteiras de vapor d’água
deixadas por aviões que passavam.

às vezes penso em como
elas se intersectam no espaço
mas nunca no tempo.
 
 
(2000)

após jantar

perder-me no mar e ninguém dar pela falta. como se nunca tivesse existido.

nada digas,

mesmo que não seja verdade.
deixa-me ao menos uma vez na vida
pensar que sim.

ecos de vozes enchem a sala.

a música como ruído de fundo.
o meu olhar perdido na cintilação das luzes da outra margem.
entre todos estou só.