do que me lembro:
dela, sentada sobre a relva, as pernas dobradas à direita do corpo. o à-vontade duma menina sentada num sofá invisível.
retira um bloco de notas da mala que havia pousado a seu lado. a mala é colorida. os sapatos são a condizer. em cada pé, uma borboleta.
enquanto escrevinha, distraída, exige-me que fale. “fala!”
não sei o que dizer. não sou interessante, não tenho sobre que falar. não me ocorre uma palavra sequer.
limito-me a seguir o desenrolar de cada gesto seu como se assistisse a um filme. olho-a, enlevado, do fundo da minha mudez. registo mentalmente as imagens que sei vir a querer rever vezes sem conta.
o sol e o calor. o verde e a sombra. sâmaras rodopiam sem pressa do topo dos ulmeiros. vão descendo numa quase suspensão até pousarem à nossa volta. o tempo esquece-nos; ninguém existe para além de nós.
subitamente, lembra-se. interrompe o esboço e pede-me que lhe diga por fim onde a beijaria.
sorrio, envergonhado. também eu me sinto como um miúdo, afinal. tomo-lhe o antebraço na mão direita e com a esquerda mostro-lhe onde. ela sorri de volta. é a primeira vez que nos tocamos.
pergunta-me ainda de que mais gosto nela para além disto (escreve-o numa página em branco que me dá a ler). ocorre-me apenas dizer “tudo”, num repente. os cabelos pretos caindo-lhe sobre os ombros. o silêncio. acabo por nada dizer.
…nunca mais estes momentos serão nossos. penso-o.
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de todas, é esta a imagem que mais quero guardar de ti. aquela que, sem saber, lembrava antes mesmo de te conhecer.